Huíla - O Serviço Nacional de
Recuperação de Activos (SENRA), órgão da Procuradoria-Geral da República (PGR),
retirou, na semana passada, na cidade do Lubango, na província da Huíla, de um
stand de automóvel, 14 viaturas "topo de gama", avaliadas em mais de
um milhão de dólares, pertencente à empresa Samoma Big, Lda, por suspeitar que
a empresa terá sido criada por um dos arguidos do "caso Lussati" e
entregue a um terceiro apenas para camuflar crimes.
Oempresário e proprietário da
empr
Segundo o proprietário das 14
viaturas, nem a PGR nem os tribunais o chamaram para prestar declarações na
qualidade de testemunha ou de declarante do processo "Lussati". O
homem diz ter sabido da situação pelo SENRA apenas na altura em que foram
retiradas todas as viaturas da sua concessionária, na semana passada, na cidade
do Lubango.
Em declarações ao Novo Jornal,
Jacinto Inácio Samoma disse que há dois anos a empresa foi encerrada pelos
oficiais da PGR por estar alegadamente envolvida no processo do "caso
Lussati" por ter feito, segundo contou, o negócio da venda de duas viaturas
do coronel e antigo financeiro da Unidade de Guarda Presidencial, José
Tchiwana, arguido no processo "Lussati".
Ao Novo Jornal, o empresário
assumiu ter feito a venda de duas viaturas do coronel no seu stand, mas alega
que nunca foram sócios ou que alguma vez tenha tido participação na criação da
empresa Samoma Big, Limitada.
"Eu constitui a empresa
sozinho, nunca recebi dinheiro ou carros a mando do senhor José Tchiwana. Como
é que a PGR vem dizer-me que a minha empresa foi criada pelo senhor Tchiwana
para disfarçar os seus roubos? Que culpa tenho eu? Será mal aceitar vender duas
viaturas dele? Se eu sou empresário e esse é o meu negócio, isso dá direito à
PGR de me receber a empresa?", questiona.
Conforme o proprietário, aquando
da apreensão da empresa, que considerou abusiva, foi à PGR-Huíla e mostrou aos
oficias daquele órgão as provas documentais da constituição da empresa, assim
como os comprovativos da aquisição das viaturas na Europa e no Dubai.
"A PGR não voltou a
chamar-me e fiquei à espera que o tribunal também assim o fizesse. Infelizmente
nunca me ouviram, mas estão a receber-me a empresa e os carros", lamentou
o empresário, que diz ser de uma família de negócios.
Jacinto Samoma reiterou que
apenas ajudou o cidadão José Tchiwana a vender duas viaturas suas no seu stand
e em anos diferentes.
"A primeira vez foi em 2014
e a segunda em 2018, não sei de onde tiraram a ideia de que a empresa é dele.
Afirmo que a empresa é minha e o senhor nem sequer é meu sócio, a minha sócia
na empresa é a minha filha", esclarece.
O proprietário das 14 viaturas
diz que nas autoridades apresentou todos os documentos e comprovativos de cada
uma das viaturas e da documentação da titularidade do espaço, mas que nunca foi
chamada para o processo do "caso Lussati" para esclarecer e comprovar.
Para seu espanto, contou, ouviu
dizer que haveria um leilão e informou os seus advogados que lhe disseram que
não seria possível executar o leilão, porque o caso está em tribunal.
Desde que começou o
"processo Lussati", em 2021, o proprietário diz nunca ter sido ouvido
durante a instrução do processo e que a atitude do SENRA constitui uma violação
do princípio do contraditório.
Jacinto Samoma explicou ao Novo
Jornal que tomou conhecimento na PGR-Huíla que foi considerado pela PGR como a
figura de terceiro de má-fé, e diz desconhecer o que terá feito para ser
considerado nesta pessoa.
Ao Novo Jornal, dois juristas
explicaram que esta figura existe no Código do Processo Penal Angolano, e que
esta pessoa é alguém que se coloca na posição de ocultar as provas de uma
investigação para beneficiar outra que é alvo de um crime e perseguido.
Pedro Mendes, jurista, diz que é
a pessoa que esconde os bens de outrem, no seu nome, para desviar o visado da
justiça.
Segundo este jurista, essas
pessoas são também investigadas e interrogadas, não devem ser deixadas de fora
do processo judicial para se defender mediante os indícios que a PGR ou os
tribunais tenham em sua posse.
Francisco Muteka, outro jurista,
explicou que o terceiro de má-fé tem o direito de se defender, contestar e de
juntar requerimentos sobre um determinado processo.
"Se o tribunal entender
condenar os bens desta figura, o terceiro de má-fé tem ainda o direito de
recorrer da decisão", salienta.
Francisco Muteka advoga que para
o caso em concreto, houve falhas gravíssima do Serviço Nacional de Recuperação
de Activos em receber bens cujo proprietário não foi arrolado no processo em
julgamento.
"Neste caso ele tem direito
à palavra, tem direito a pronunciar-se da qualidade em que foi colocado no
processo. O contraditório tem de lhe ser dado, sob pena de a PGR violar os
princípios basilares da Constituição da República", explicou o jurista,
precisando que o procedimento do SENRA não está correcto.
Jacinto Samoma, o agora
considerado terceiro de má-fé, diz que nunca foi ouvido nem chamado pelo
tribunal e que ficou de fora do todo o processo "Lussati".
Segundo a PGR, a empresa Samoma
BIG Lda, um estabelecimento comercial de venda de automóveis, criada em 2011,
por Inácio Samoma, "é terceiro de má-fé", conforme a Lei n.º 15/18,
de 26 de Dezembro, sobre o Repatriamento Coercivo e Perda Alargada de Bens.
O Novo Jornal, que procurou ouvir
a PGR, mas sem sucesso, soube de fonte judicial que as 14 viaturas removidas
serão postas a leitão pelo SENRA nos próximos dias.
Por sua vez, o Serviço de
Recuperação de Activos diz que o leilão é legal e que os bens apreendidos
estavam a degradar-se.
Eduarda Rodrigues, Directora
Nacional SNRA, justifica o leilão como um processo que visa evitar a
deterioração meios apreendidos.
"Os bens apreendidos, muitos
deles em 2020 e 2021, estão a deteriorar-se permanentemente. Se formos aguardar
pelo final do processo-crime, muito provavelmente, estes bens já não serão
utilizáveis. Como estamos a falar de viaturas e embarcações que estão a se
deteriorar, há a necessidade de tomarmos uma decisão", explicou.
Conforme Eduarda Rodrigues, o
próprio Código do Processo Penal dá uma solução específica a isso e considerou
que os leilões são legais.
De referir que o acto da remoção
das 14 viaturas, avaliadas em mais de um milhão de dólares, foi realizado na
madrugada da passada quinta-feira, sob forte escolta da Unidade de Reacção e
Patrulhamento (URP)